Os embates entre as facções
criminosas voltaram a se intensificar no Ceará, ao passo em que os atentados
contra o Estado e a propriedade privada reduziram a quase zero. Somente em seis
dias, três ocorrências com mortes múltiplas foram registradas pela Secretaria
da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).
Fontes ligadas à Pasta afirmaram à
reportagem que os últimos crimes demonstram que o acordo de "não
agressão" entre as facções, visto durante quase o mês de janeiro inteiro,
começou a declinar em algumas regiões do Estado e está prestes a acabar. Até a
semana passada, os grupos criminosos estavam mais preocupados em cometer
atentados (foram 270 ocorrências), o que diminuiu vertiginosamente o número de
assassinatos em território cearense.
Um oficial da Polícia Militar
conta que as facções precisam recuperar o dinheiro perdido na série de ataques.
"Esses criminosos se rebelaram contra Luís Mauro Albuquerque (secretário
da Administração Penitenciária), porque tinham medo de serem colocados juntos,
nos presídios, quando ele falou que não reconhecia facção. Mas pacto para não
se matarem não existe. Quando começa a demanda, eles vão disputar território
para arrecadar dinheiro. As facções estão descapitalizadas porque todos os
líderes estão presos e sem comunicação. Agora, os homicídios devem aumentar
para venderem drogas e arrecadarem mais", analisa.
Um policial da Inteligência da SSPDS destaca que o reforço da Segurança Pública
do Ceará - com agentes da Reserva Remunerada da PM, tropas federais e militares
de outros estados - inibiu diversas ações criminosas, o que fez as facções já
voltarem as atenções para o seu sustento. E, além disso, o efetivo policial irá
diminuir, com o fim dos ataques. "A ocupação policial, nos últimos dias,
foi intensa. O comércio de drogas está com dificuldade. Os traficantes estão
cientes disso e não aguentam muito tempo sem ganhar dinheiro", revela.
Triplo
homicídio
O último caso foi um triplo
homicídio ocorrido no bairro Carlito Pamplona, em Fortaleza, na madrugada de
ontem. Pelo menos três veículos pararam em frente a um tríplex, na Rua Tirol, e
criminosos armados desceram para cometer uma execução com características
típicas da atuação das facções.
O grupo arrombou o portão do
imóvel, subiu até o segundo andar e encontrou o alvo da ação criminosa:
Francisco Adriano do Nascimento Gregório, de 37 anos. Ele, a esposa Janaína
Carneiro da Silva, 32, e o filho Anderson Mendes do Nascimento, 18, foram
raptados e alvejados. Os dois homens morreram no local, enquanto a mulher foi
socorrida e levada ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos.
Francisco Adriano tinha passagens
pela Polícia por tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo, roubo e
receptação. Ele foi preso em flagrante, na posse de ilícitos, no dia 15 de
janeiro do ano passado. Um ano depois, no último dia 10 de janeiro, o detento
progrediu para o regime domiciliar, com monitoramento eletrônico por
tornozeleira.
Na saída, os criminosos deixaram
pichações pelas paredes: "GDE 745", em referência à organização
Guardiões do Estado (GDE); e "Vai ter mais", uma evidente ameaça aos
moradores da área. O tráfico de drogas na região onde aconteceram as execuções
é dominado pela facção rival, o Comando Vermelho (CV). Por duas vezes, a
reportagem do Sistema Verdes Mares (SVM) foi ameaçada e expulsa do local do
crime, por moradores.
GDE e CV travam uma guerra, em
todo o Ceará, por território para o tráfico de entorpecentes, o que impulsionou
o número de homicídios no Estado desde 2017. As duas facções também são
apontadas como as responsáveis pela maior série de ataques ao Estado e à
propriedade privada da história do Estado, registrada no mês de janeiro.
'Modus
Operandi'
Poucos minutos após o triplo
homicídio, a cerca de 4 km de distância dali, na Rua do Leme, Barra do Ceará,
Adenilton Gadelha dos Santos, o 'Natalino', 22, também foi executado a tiros,
dentro de casa. Os autores foram três homens que utilizavam balaclavas.
O 'modus operandi' foi semelhante
ao do triplo homicídio e, também devido à brevidade de horário e espaço, a
Polícia Civil suspeita que os crimes estejam relacionados e tenham sido
cometidos pela mesma quadrilha - o que elevaria o caso ao status de primeira
chacina do ano no Estado (mais de três mortos). A investigação está por conta
do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
A vítima possuía antecedentes
criminais por homicídio, roubo e corrupção de menores. A 2ª Vara do Júri de
Fortaleza havia recebido a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE) por
homicídio qualificado contra 'Natalino', no último dia 7 de janeiro, no
processo acerca do assassinato de Everton Miguel Farias de Queiroz, ocorrido na
noite de 22 de abril do ano passado, na Rua Chico Xavier, no bairro Goiabeiras,
na Capital.
Ocorrências
Dois duplos homicídios com
características de envolvimento do crime organizado foram registrados no
Estado, no último sábado (26). Danilo José de Freitas Taveira, 30, com
passagens pela Polícia por roubo e receptação, e Jean Lucas Chaves de Souza,
22, foram mortos a tiros, no bairro Granja Portugal, em Fortaleza.
No
mesmo dia, os corpos de Antônio Diego Lima Cordeiro, 31, e Alexandre Silva de
Mesquita, 27, foram encontrados na zona rural do Município de Santa Quitéria,
com marcas de violência. A motocicleta de Antônio Diego foi encontrada próximo
ao local de crime. Os casos são investigados pela Polícia Civil.